quarta-feira, 25 de abril de 2012

O casamento da princesa

Por: Paulo André dos Santos.
Um casamento multimilionário, um espetáculo na TV. Muita gente viu, em vários países, através da Internet, ou, principalmente, por meio das redes de TV. Realmente, foi uma cerimônia muito pomposa. Aliás, seria melhor classificá-la de triunfal. Sim, o triunfo do escárnio sobre os pobres. Fala-se que foram gastos cifras astronômicas com a logística matrimonial. Diz-se que, ao todo, o evento custou em torno de um bilhão de dólares, mais do que o PIB de muitos países. Somente para exemplificar, esse dinheiro daria para alimentar uma população de 10 milhões de pessoas, por cerca de 20 dias, com uma refeição de 5 reais. É muito dinheiro, caro leitor. Sobretudo, por que se trata apenas de um casamento, ainda que seja de um membro da Família Real Britânica. Para se ter uma idéia, cerca de um quarto da população mundial, um bilhão e meio de pessoas, vivem em condições sub-humanas, na extrema miséria, das quais, em grande parte, residem no continente africano. Na Etiópia, por exemplo. Imersas profundamente e arrastadas pelas correntezas do capitalismo, as pessoas – muitas delas – sequer chegam a refletir sobre fatos e acontecimentos, que se protagonizam. Não se trata de massacrar o capitalismo, ou, de defender veemente o sistema socialista, mas, de simplesmente provocar alguma reflexão. Portanto, a intenção desse diálogo não é promover idéias, simplesmente, mas de refletir sobre elas e – quem sabe?- discutir o assunto em um plano mais elevado. Assim, a intenção não é tão somente criticar a Família Real Britânica, mas de exercer uma autocrítica sobre a lógica de consumo da sociedade. Uma ideologia de consumo capitalista que, conseguiu atingir atualmente proporções para além da necessidade. O que as pessoas gastam com supérfluos, por exemplo, daria para ajudar, localmente, uma legião de famintos. Em contrapartida, a sede de provar algo inédito faz com que não se olhe para trás. A obcessão para subir as escadas impedem quaisquer possibilidades de visita ao porão. O antigo, o arcaico, empoeirados, revelam pouca atratividade. A quantidade de novidade produzida é tão grande e sedutora que, preponderantemente, torna-se muito difícil olhar para o passado. É como deixar-se levar pelas correntezas sem sequer ter noção para onde se vai e, por mais incrível que se possa parecer, de onde se veio. A sociedade capitalista contemporânea é isso, uma fábrica de tempestades e correntezas, que arrasta multidões para o consumo desenfreado de bens materiais e serviços, desnecessários. A necessidade, na verdade, é produzida, aprendida no seio das relações sociais, como também, através dos meios de produções culturais dominantes. No momento em que, devido a fatores multiplos, percebe-se que a realidade é tão somente uma projeção de imagens, estrategicamente pensadas e planejadas, pode-se sentir uma dor capaz de penetrar na alma e de estragar as doces e fabulosas lembranças. Nesse momento, é possível que um conflito surja: permanecer na fábula ou encarar a dura realidade, a de que se é, assim como a grande maioria, apenas alimento para o famigerado e dinâmico sistema. Nesse instante, pode-se aprender a lição de que o despertar da consciência é um processo e um produto doloroso, que fazem muitos desistir e retornar ao estado confortável de imersão nas fábulas. Afinal, poucos suportariam a solidão e o esquecimento, a que são condenados os que se opõem e negam a legitimidade do sistema. Ao retomar a discussão sobre o casamento da princesa, pode-se afirmar de que é tão amplarmente aceito e valorizado, por que projetam nas pessoas o desejo de estarem no lugar de um dos pares matrimoniais. Desperta nas pessoas o desejo pelas honrarias e homenagens, pois, como afirma Nietzsche, tudo o que é vivo e anda, tem desejo de potência, desejo de poder. Assim, qualquer um pode ter e ser, pelo menos, simbolicamente. E isso, junto a outros fatores, constitui-se em um potente combustível para a dinâmica do consumo.

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