sexta-feira, 29 de maio de 2009

Um recado no Orkut...

POR: PAULO ANDRÉ DOS SANTOS.

Em uma fria madrugada de sexta-feira, enquanto a cidade de Salvador chorava os desastres provocados pelas chuvas, eu era o escravo mais celebre da insônia. Ouvia por inúmeras vezes a música crítica de Max Gonzaga, “classe média”. Enquanto isso, eu acessava aos meus recados no Orkut, futricando ali e aqui, nos perfis alheios. Os meus olhos foram se cansando da vista que se fazia à minha frente, as mesmas pessoas e a mesma falácia de sempre. Apesar de conectados ao mundo, a maioria das pessoas adoram criar um universo restrito em suas abordagens. Eu, infelizmente, estava incluído entre essas pessoas. De repente, um recado tosco, de muito mal gosto, que ainda, acompanhado de uma imagem necrótica, fez-me recobrar a consciência e a indignação. Mentes duentis, pensei a primeiro momento. Na verdade, não era isso. Era apenas um recorte da realidade, fatos que vitimavam a cidade naquele momento. Centenas de desabrigados, os sobreviventes náufragos do descaso, agora levados à evidência, pois, os repórteres vão aonde a notícia estiver. Não para promover mudança, mas, a fim de criar um atrativo midiático que possibilite a agência algum lucro. Fotos de corpos embalsamados pela lama das enchentes se tornam um troféu nas mãos de um repórter, ainda mais se já estiverem em decomposição. Notícia! Esse princípio e fim jornalístico é alçado à prioridade até as últimas consequências. O mais é valorizado é a vendagem, a audiência e o lucro auferido a partir disso. Já não é relevante pensar se é adequado ou não vincular determinada notícia, com esse ou aquele destaque, considerando-se a responsabilidade social embutida no fazer-notícia. O Sistema é bruto!!! Esbravejam alguns grotescamente na TV. Acabam potencializando o ódio e a violência, ao agirem dessa forma. Vão aos presídios para escarnecer dos recém chegados à ilha dos inadimplentes com a sociedade. O problema é que os inadimplentes, de acordo com o veiculado na mídia, geralmente, são os pobres. Descaradamente, omitem o dilema histórico desses sujeitos, submetidos desde a tenra infância a conviverem com(o) os ratos. Além disso, quando algum figurão é flagrado roubando dizem que é uma doença (cleptomania) ou qualquer surto psicótico. Se filho de doutor, quando usa drogas, é uma pobre vítima da depressão psicológica. Quando os tachados de filhos-de-ninguém pela burguesia são flagrados embebidos de alucinógenos, é uma pancadaria sanguinária. São chamados de vagabundos, mas, vagabundos por quê? Esse é um detalhe que não revelam em sua verdade. Eles criminalizam da pobreza como se a própria condição de pobreza já não fosse uma punição suficiente. Ao mesmo tempo em que uma dezena de coronéis desfrutam da posse, do (des)mando, de todo o dinheiro e das terras, uma galeria imensurável de pobres são explorados até a alma nos mecanismos de sub-empregos, sem pão, sem-teto, sem terra. Esse é o cenário, essa é a notícia que insiste em não ser revelada. Quando as chuvas desabam sobre a cidade, a insônia, de que fui parceiro nessa noite, passa a ser a detentora daqueles que, sem outro lugar no mundo, se vêem condenados a ficar em suas casas, penduradas nos penhascos dos morros. Enfim, é nesse lugar que se alojam os condenados à falta-de-tudo: saneamento básico, assistência médica, energia elétrica, educação, dignidade, cidadania etc.

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