sábado, 28 de novembro de 2009

Sem destino algum.


Autor: Paulo André dos Santos.

Tudo é tão efêmero, tão rapidamente transeunte, tão nebuloso, que fica difícil identificar quem foi que passou por nós, pelo caminho. As andanças intermináveis, à medida em que denuncia um caminho sem-fim, em virtude da velocidade que se impõe à viagem, impede-nos uma contemplação menos superficial da paisagem. Já não se tolera o deleite prolongado, pois, antes de um novo dia, o significado das coisas envelhecera. E isso, profundamente, mexe com o horizonte da cultura, uma vez que não resta mais tempo à tradição. Tudo, agora, é moda, é novidade. Tudo agora, é flash. A instabilidade suga os nossos pés, de modo que nos sentimos perdidos, atordoados, em busca de algo concreto para nos instalar. Tudo, agora, parece cada vez mais livre da previsibilidade, cada vez mais fora de lógica, de controle. Apesar de todo o esforço, de todas as especulações, o futuro é cada vez mais gasoso, mais impalpável e menos imaginável. As novas teorias que vão surgindo, ao longo dos anos, ao mesmo tempo em que devoram suas anteriores, as resgatam, as dão nova vida e as fazem novamente caminhar. A história já não se condiciona a seguir em frente, mas, constantemente, vive retornando às origens, ressuscitando personagens mortos e os fazendo cantar a antiga melodia. Estamos à solta, sem rumo, sem destino algum, que seja, confiavelmente, alcançável. E por não usufruir mais da capacidade divina de rasgar as barreiras do tempo, decidimos aproveitar o momento, o tempo, as paixões coloridas, tão intensamente vividas, marcadas por experiências dignas de uma eternidade.

domingo, 22 de novembro de 2009

Aquarela da vida.



AUTOR: PAULO ANDRÉ DOS SANTOS.

A nossa experiência de vida nunca é igual a anterior, nem mesmo, principalmente, se vivenciada por distintos atores. Concorda-se com Heráclito quando disse que “Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio”. Mesmo que, aparentemente, a sensação seja a mesma, as águas já não são mais, pois, a correnteza levou. Em pleno sábado de sol, resolvi prestigiar o que estava ocorrendo em alguns museus da cidade. Uma necessidade de satisfazer o desejo gestado nos últimos dias. Mergulhei com alma nos mares profundos e colhi uma pedra preciosa. Cheguei em terra firme com a clareza de que a oportunidade é um bem precioso. Tudo o que somos, o que nos tornamos, é, em parte, fruto de nossas escolhas, mas, mais do que isso, é a colheita possível ao solo em que a semente fora plantada. Tudo o que acontece é sempre em virtude de uma possibilidade. A vida é uma possibilidade. O crescimento e o sucesso, também. As ações e emoções são o produto das possibilidades humanas. Cada ser humano é único, apesar das semelhanças que caracterizam o caráter humano. Sobre isso, Sofhie Calle, sob expressar muito bem essa multiplicidade dentro da unicidade humana. A partir de uma carta enviada por e-mail ela enxergou inúmeras possibilidades de contemplar a existência diante da leitura do conteúdo da mensagem por outras pessoas. Diante das palavras que simbolicamente transitam no nosso inconsciente, nossas impressões são muito diferentes. Por isso, as nossas ações também. E nossas ações não são um número exato, não são cálculos precisos. A resposta sempre vai depender do nosso estado psicológico e afetivo, no momento. O lugar e a ocasião possuem a sua força de influência. Tem o poder tanto de inspirar ações positivas quanto de influenciar atos na direção da frustração. Sobre o lugar, propiciamente, muito perto dessa lavoura, encontra-se o “Tempo profundo”, de Lica Muniz de Aragão. Depois de termos sido convidados a conhecer o trabalho de Sofhie, em que se demonstra o humano como ser único, a exposição de Lica nos mostra que apesar de sermos, cada um, único no mundo, estamos ligados um ao outro. Mais do que isso, fazemos parte de uma imensa diversidade vivente que se comunica, também, regido pelas possibilidades. Lica nos traz o mar de Salvador como obra viva. Um mar que tem seus momentos de revolta, mas, que, também, conserva uma docilidade e tranqüilidade capazes de inspirar o lirismo dos poetas. Aliás, o inesquecível Dorival Caymmi cantara que até a morte é doce se for no mar. Mas a morte cantada pelo artista não deve ser a morte triste das algas, dos peixes e dos outros habitantes do mar. A morte, nesse sentido, não é a consequência do desastre da consciência humana, em que paga toda a dádiva da natureza com as pedras da intolerância. Apesar de sermos diferentes, como belamente subilinhado no trabalho de Sofhie, somos, em essência, uma só coisa, a vida. Somos as cores que colorem esse mundo com a totalidade de suas combinações. A nossa textura por si só não torna a vida bela, mas a aquarela que formamos quando nos misturamos harmoniosamente a outras, a magnífica diversidade de vida que se expressa e que nos faz acreditar que tudo isso é obra digna de um ser supremo.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

A escola na escola.



~
A Cidade começa na escola.
As pessoas e fábricas também.
O professor, o arquiteto, o advogado,
Todos eles começam na escola.
O jornalista, o policial, o traficante e o juiz,
Todos eles começam na escola.
A riqueza, a pobreza, a miséria,
Todos, começam na escola.
É hora da merenda, a bola rola.
Pra fora! Bola na escola.
Risos, choros, travessuras e travessias,
Tudo acontece na escola.
Tudo, acontece na escola.
~
Autor: Paulo André dos Santos.

domingo, 15 de novembro de 2009

O sagrado silêncio.


AUTOR: PAULO ANDRÉ DOS SANTOS.

Há tempos em que, envoltos em determinadas circunstâncias, soa no imaginário coletivo a necessidade imperiosa de se exercer protagonismo, de assumir uma postura enérgica, interventora. Ora por vezes perguntam: “Vai ficar aí parado? Não vai fazer nada?”. O silêncio, nesse sentido, como uma alternativa de resposta, fica, muitas vezes, às margens do rio, longe das correntezas que arrastam os acontecimentos. Na nossa cultura o silêncio é interpretado como a ausência de resposta, como uma omissão. É comum pessoas que vivenciam esse contexto serem censuradas sob a indignada alegação de falta de iniciativa, de habilidade e, especialmente, de coragem para conduzir determinadas situações. Muitas vezes isso é verdade. No entanto, há situações em que o silêncio é uma virtude, uma sabedoria, uma qualidade humana que expressa traços da mais suprema liberdade. Concordo com o escritor Fábio de Melo, quando diz que o que acontece de melhor na vida, geralmente, está marcado pelo que há de mais sublime no momento, o silêncio, o trem silencioso que nos faz captar toda a essência de nossa existência. O silêncio é muito mais do que um vazio de sons, é, na verdade, em muitas vezes, um texto completo, um momento sagrado, onde se revelam novos sentidos para a nossa vida e nos presenteia com novas possibilidades e oportunidades de recompor-nos, de sarar as rachaduras deixadas pelos tombos levados nas andanças pelos caminhos hostis de nossa trajetória. Talvez, a estrutura cartesiana de nossa cultura nos feche esse horizonte. Talvez, esteja a sempre nos impedir de contemplar o que há de caos no silêncio, a dúvida, a incerteza do que está por vir. Estamos tão habituados à verdade, de modo que, não conseguimos tranquilidade enquanto não encontramos uma resposta para nossas indagações, precisamos de uma resposta para tudo. Um silêncio, visto como falta de eco nos acontecimentos, incomoda, causa desconforto e, em muitos casos, indignação.

domingo, 1 de novembro de 2009

Escolas em preto e branco.




Escolas em preto e branco,
Riscos num quadro negro,
Pinturas que nada inspiram,
Faz silêncio o palavreiro...

***

...Nos corredores agonizantes,
Resmungam inquietados,
Entre palavras de silêncio
E gestos domesticados...

***

Mas gritam os inocentes.
Derramam pelas paredes,
As súplicas de socorro,
À fala, à fome, à sede.

Autor: Paulo André dos Santos.