quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

A caminho da delegacia

Por: Paulo André dos Santos.

Como costumo pensar, os rumos de nossa vida são definidos nos momentos menos importantes, nos pequenos detalhes. Uma escolha impensada pode provocar marcas catastróficas para nossas vidas e para a vida dos outros.

Um exemplo disso, foi o que aconteceu em Salvador numa tarde de domingo. O caso teve repercussão nacional, em inúmeros veículos de comunicação. Uma mulher foi às compras em um supermercado no bairro do Rio Vervelho. Aparentemente, tudo ia bem. A senhora, que atendia pelo nome de Maria Bouzon escolheu o que queria comprar e seguiu até a fila de um dos caixas.

Maria Bouzon, uma senhora de aproximadamente cinquenta anos vivenciou, talvez, a pior das tempestades de sua vida. Provavelmente, quando saiu de casa para ir às compras não imaginava o desfecho de que ia se desenhar: três dias atrás das grades, na cadeia. Nada pensava a esse respeito. O dia seria normal, sem nada especial a acontecer.

Entretanto, eis que ela se traiu. Agiu com uma prepotência desmedida e inconsequente, que lhe custou caro. Permitiu-se agredir de maneira atroz uma caixa de supermercado, e por isso, como primeiro castigo, a exposição ao ridículo e à "vergonha eterna". Depois, ainda poderá responder judicialmente.

O que era para ser apenas um momento de compras em um supermercado, tornou-se um espetáculo. Um espetáculo de horror. A senhora Maria Bouzon não se conformou em ouvir um "não pode" e resolveu agredir moralmente a atendente do caixa.

Tudo para massacrá-la, moralmente. Só que o momento veio a calhar e, como afirmava minha saudosa avó, "deixe o prego que o martelo chama". E dessa vez não só chamou, mas, gritou e gritou alto. Para ser mais preciso, a delegada de polícia estava logo atrás dela. Uma feliz providência para quem estava sendo humilhada e um infortúnio merecido para a senhora Maria Bouzon.

Tudo por causa do preconceito racial. Tudo por causa do ímpeto para humilhar o próximo. Tudo por uma vontade mesquinha de se sentir maior, superior a outra pessoa. A senhora Bouzon, certamente, não irá esquecer desse domingo. Eu, particularmente, acho condenável tal atitude. E você, caro leitor? Sabe-se que o racismo é crime, todos tem o conhecimento disso. No entanto, temos de admitir que essa questão tem desafiado educadores em todo mundo, sobretudo, no Brasil, onde existe um déficit educacional.

Temos que admitir, também, que o sistema econômico capitalista nos impõe uma "luta sanguinária" aos seres humanos, entre si. Toda a sua lógica perpassa pelo individualismo e pela superação e esmagamento do concorrente. Não há nada de ético nisso! É importante frisar que isso não minimiza, ou exime, qualquer pessoa de praticado racismo, mas, o que se quer expressar é que existe a influência de um problema maior, a falta de ética.

Aliás, há uma grande fragilidade em nossa formação ética. Quem não ouviu falar no "jeitinho brasileiro"? Pois é, tal maneira de se comportar desnuda a nossa fragilidade. O que muitos dizem muitas vezes ser uma qualidade, constitui-se em contextos específicos em um deficiência. O racismo é somente mais um sintoma da doença, que podemos chamá-la - pela falta, ou, pelo desconhecimento de um nome mais apropriado - de Síndrome da degeneração ética.

Ser racista, ser violento, ser cruel para com os outros, é um reflexo de como gostamos tão pouco de nós mesmos. É um reflexo que revela o quanto precisamos melhorar, evoluir como ser humano. Pessoas que agem dessa maneira podem até estar sorrindo, mas, provavelmente, ainda não experimentaram a felicidade. Quem enxerga tudo azul não tem sede de sangue. Então, a vida moderna tem nos tornado infelizes e incapazes de convivermos entre as pessoas sem manifestarmos egoísmo e mesquinhez.

O caso da senhora Bouzon é mais do que um fato isolado. É um acontecimento que solicita uma reflexão. Existem passados que não morrem. Parecem se perpetuar no vento. Depois de milhares anos, certas mazelas humanas permanecem. Mazelas que tornam o viver e o conviver, em muitos casos, quase insuportável.

Aos nobres visitantes.

Por: Paulo André dos Santos*
Como quem não quer nada. "Sem o quê nem pra quê", despretenciosamente, em pleno janeiro de 2012, o Presidente Obama resolveu agraciar os brasileiros com uma "dádiva". Agora, ficará mais fácil conseguir um visto no passaporte para os brasileiros que anseiam em conhecer a terra do Tio Sam.

Isso soaria um pouco cômico, se não fosse apenas o interesse pelo dinheiro dos turistas, já que, como admitiram, os brasileiros estão entre os que mais gastam em solo americano. Infelizmente, confirmando a afirmação do dito popular, a memória do brasileiro é fraca.

Não por que tenhamos algum problema fisiológico, mas por que se escolhe o esquecimento como fórmula para aliviar os malfeitos sofridos. Diz-se que o brasileiro é um povo alegre, entretanto, talvez, isso não lhe seja da natureza, mas uma alternativa ao sofrimento, por que o brasileiro, definitivamente, sofre muito. Sofre com os impostos, com a corrupção, com a violenta desigualdade social, etc.

Assim, retornando ao assunto da dádiva americana, é incrível constatar tal reviravolta. Saímos da condição de persona non grata em solo americano, para nos tornarmos, em um passe de mágica, nobres visitantes. Parece até profecia, pois como escrito na Bíblia, "Os humilhados serão exaltados". Pensar que por muitos anos estivemos de pires na mão rogando por migalhas. Pensar que muitas vezes fomos humilhados e deportados ao pisar em solo americano. Esse mundo dá voltas mesmo!

Nos últimos anos, os americanos tem assistido inconformados o avanço das economias emergentes. A China, então, tem lhe provocado calafrios. Com uma média de crescimento próxima dos dez por cento ao ano, os chineses estão conquistando o mundo e os americanos estão colocando as "barbas de molho".

A exemplo disso, Brasil, índia e Rússia também estão fazendo bonito. No caso do Brasil, que vem crescendo continuamente, o otimismo é coerente. O Risco Brasil, índice econômico que avalia a credibilidade de um país em honrar os compromissos, nunca esteve tão bom. Tanto que, mesmo exageradamente, no meio de uma crise imobiliária americana, o então Presidente Lula tenha chegado a oferecer dinheiro emprestado aos Estados Unidos.

Em verdade, é um exagero, pois apesar de todo o clima de otimismo perante o cenário da economia brasileira, o país ainda amarga ínumeros problemas sociais. Verdade também que em nenhum outro momento das história tenhamos avançado tanto em indicadores sociais, mas não dá, ainda, para dizer que somos um país desenvolvido. Precisamos avançar e muito.

Enquanto isso, que continuem nos tratando como nobres visitantes, pois, como anuncia a propaganda comercial da Jonnie Walker, em 2012, "o Gigante não está mais adormecido". Embora como dito antes, precisemos avançar muito, é incontestável a valorização brasileira em termos econômicos.

Assim, apesar de estarmos tão longe do Brasil que queremos e de convivermos ainda com algumas sombras do passado, hoje, somos muito mais do que uma promessa. Somos um país rico, que precisa enriquecer o seu povo.

Atrás das grades.




Por: Paulo André dos Santos*

Fevereiro, como costuma cantar Ivete Sangalo, “está no clima”. E fazendo jus à tradição, fevereiro, em Salvador, é mês de muita agitação na cidade. Todos na folia, correndo, dançando e cantando. No entanto, em 2012, para nossa surpresa, o carnaval está acontecendo de outra maneira. As pessoas gritam e correm, mas não atrás do trio. Correm de medo, dos arrastões que tomaram conta da cidade.

E esse arrastão de que vos falo, caro leitor, não é brincadeira. É coisa séria. Grave! Gravíssima. A Polícia Militar baiana entrou em greve e a capital Salvador se encontra entregue aos bandos armados.

Eu disse bandos armados! Por que um punhado de homens da Força Nacional e do Exército Brasileiro, mesmo com toda a boa vontade do mundo, dificilmente, seriam capazes de suprir a ausência de pelo menos dez mil policiais militares amotinados, de “braços cruzados”.

Além disso, como se não bastasse, alguns maus policiais, conforme veiculado pelos meios de comunicações, tem promovido uma verdadeira “onda de terror” na cidade. Não um simples manifesto pela greve, mas uma estridente ação criminosa.

Enquanto isso, cidadãos e cidadãs, jovens, crianças e idosos, encontram-se impedidos de ser e de estar na cidade. Sim, caro leitor, proibidos. Severamente, proibidos. Grupos de policiais, que já tem contribuído para a imagem ruim da Polícia baiana, resolveram não somente “cruzar os braços”, fizeram mais do que isso, deixaram o Povo refém.

Não secretamente, como aqueles filmes americanos, em que sequestradores enviam uma carta à família, pedindo o resgate. Eles interditam as vias públicas, cometem atos de vandalismo, promovem uma insuportável e aterrorizante desordem. Tudo isso, somente para demonstrar o quanto são necessários à sociedade, o quanto merecem serem reconpensados com salários mais dignos.

Na verdade, caro leitor, nesse ponto uma questão que precisa ser mencionada: o foco da análise não deve ser exclusivamente esse. Não somente os policiais sofrem com baixos salários. Médicos da rede pública, professores, etc., se formos analisar, ganham muito menos, levando-se em consideração todas as exigências com qualificação profissional e acadêmica de nível superior.

Ao colocarmos na ponta do lápis, o salário inicial de um professor com doutorado, na rede pública estadual de escolas, por exemplo, provavelmente, não chega a ultrapassar os dois mil e trezentos reais que ganham, inicialmente, os soldados da polícia baiana.

Além disso, sem querer fazer defesa do Governo, quando as pessoas se propõem a encarar um concurso para se tornarem funcionários públicos, elas sabem a faixa salarial que está à espera. A pergunta é: por que se candidatam?

Outra coisa, importante mencionar, é que jamais se deve contestar o direito dos profissionais de pleitearem melhores salários. Isso é indiscutível. Mas a que preço? No caso dos policiais baianos, em greve, amotinados e de braços cruzados, será que seriam capazes de pagar pelo preço que estão impondo à população? Será que pelo menos um desses policiais tem família? Será que seriam capazes de se questionar: e se fosse o meu filho, mais um a somar entre as dezenas de mortos por causa da extrema violência que acomete a cidade? Será que poderiam se questionar sobre isso.

Fatos como esses, tem se repetido, ao longo dos últimos anos, em vários estados. Os policiais tem lutado para sair da situação, muitas vezes, humilhante a que estão sendo submetidos, sem condições de trabalho e sem uma remuneração adequada. Para a nossa tímida perplexidade, leitor, os fatos se repetem em proporções cada vez maiores e com consequências cada vez mais violentas. A que fim chegaremos. Será o Apocalipse?

Os crimes cometidos por policiais em greve, na Bahia podem até serem esquecidos pelo Estado, pelos policiais e pela sociedade. Entretanto, dificilmente, os familiares das pessoas assassinadas irão esquecer. Você esqueceria, caro leitor?

Eu sou até capaz de duvidar. Talvez, você concorde comigo que todos eles precisam de uma punição exemplar, dentro dos limites jurídicos. Assim tais acontecimentos não cairão em moda. Em contrapartida, é bom frisar, o Governo precisa ser mais proeficiente nas políticas de segurança pública. Os cidadãos e cidadãs, contribuintes que sustentam a máquina pública, não podem ser abandonados ao caos.

O interessante é que, nos dias de hoje, lamentavelmente, as pessoas dão uma audiência formidável aos casos de violência, que se noticia na televisão, no rádio e, principalmente, na Internet. Portanto, se os policiais da Bahia quiseram ganhar notória repercussão nacional, conseguiram. E de quebra, como que por um gesto de desagravo, arruinaram a frágil sensação de segurança da população baiana.

Infelizmente, em pleno fevereiro, mês da alegria popular, não podemos cantar, ainda, ao som da Timbalada, caro leitor, “já é Carnaval, cidade. Acorda pra ver. A chuva passou, cidade. O sol brilha aê...”. Neste mês de fevereiro, o sol tem se escondido atrás de núvens nebulosas. Dia e noite a chuva cai na cidade e estamos todos ilhados, neste momento, sem ter para onde ir. Chove atos de vandalismo e a violência transborda na cidade.

Assim, resta-nos um luz no fim do túnel. Políticas públicas de segurança nesses momentos de crise precisam ter um contigência mais adequada. O Povo não pode continuar exposto à tensão entre policiais e o Poder Público. Policiais e representantes do Governo precisam chegar a um denominador comum.

Contudo, apesar de admitir essa hipótese, não quero acreditar sequer na ideia de que atos criminosos cometidos por militares sejam esquecidos. O espírito da lei foi erguido para equilibrar as forças entre os antagonismos dentro da sociedade. A lei deve e, imperiosamente, precisa ser cumprida. Por lei, um policial deve zelar pela lei. Quem comete atos criminosos precisa ir para atrás das grades, nesse caso, não existe excessão.

Então, como diz Caetano Veloso, “a Bahia é linda. Salvador é linda”. O Carnaval em Salvador não tem igual. A Polícia Militar todos os anos, também contribui com a festa. Este ano tem que ser diferente?