Por: PAULO ANDRÉ DOS SANTOS
Nove dias depois da carta, Cassandro chegou à cidade de Conselheiros. Fui recebê-lo na Praça das Lamentações. Era o lugar mais aprazível da cidade, possuía um velho chafariz que dava um tom imponente e um agrupamento de árvores que oferecia uma paisagem impressionante. Quando cheguei ao local, ele já me esperava. Trazia consigo duas crianças. Eram seus filhos, Felipo e Amanda. O garoto estava um pouco escabreado, a menina era só sorrisos. Deu-me um abraço tão terno que me fez desejar nas profundezas da minha alma tê-la conhecido a mais tempo. Após um longo silêncio, Cassandro me abraçou em lágrimas, disse-me que há muito tempo sentia o desejo de se reaproximar, mas o ressentimento cegava-lhe o coração. Eu disse a ele que por todos esses anos, no recôndito da minha solidão, habitava ainda uma faísca de esperança.
Após alguns instantes, seguimos em direção à minha casa. Não estava muito distante da praça, depois de dez minutos de caminhada chegamos. As crianças foram logo conhecer os jardins ao redor da casa. Enquanto isso, aconchegamos-nos na sala, tomamos chás e conversamos sobre a situação política da cidade de Conselheiros. Cassandro sempre foi interessado em política, quando mais jovem já se percebia a sua avidez em saber os acontecimentos da cidade, alimentava amizades com as pessoas mais envolvidas em assuntos políticos. Quando me perguntou sobre a situação atual da cidade, disse-lhe que nada mudou de significativo nos anos em que ele estivera ausente, exceto a recente implantação do sistema de fornecimento de energia elétrica, que tornou as ruas e praças movimentadas no período da noite. Isso trouxe mais vida à cidade. As luzes ofereciam às pessoas uma sensação maior de conforto e de segurança.
Surpreendentemente, Cassandro relatou a sua intenção de permanecer na cidade de Conselheiros. Estava disposto a comprar uma pequena chácara, situada nas proximidades do rio Batatás. Empolgado, anunciou-me a sua pretensão de se candidatar à Prefeito da cidade nas eleições que se aproximavam. Tinha projetos de modernização da cidade para alavancar o turismo ecológico. Argumentou que a cidade de Conselheiros possui inúmeras cachoeiras e formações rochosas com pinturas rupestres, sem falar da variedade culinária da cidade. Com todo esse patrimônio de riquezas naturais e os dotes culinários da população local, aliados a investimentos na infra-estrutura da cidade, elevaria Conselheiros a um lugar de destaque entre os principais pontos turísticos do interior da Bahia.
Em meio a essa prosa, eu e Cassandro passamos a observar o cenário que se apresentava através da janela. Era a visão de um beija-flor, que como poesia visitava as flores do meu jardim. Estávamos paralizados diante de tanta beleza, o beija-flor parecia violar a lei da gravidade. Possuía uma leveza em seus movimentos que perturbava a nossa percepção, pois qualquer um que ainda não tenha visto a cena, não acreditaria se ouvisse falar dela. De repente, ouvimos um grito vindo de fora da casa. Ficamos assustados e nos agitamos para saber do que se tratava. Nem bem levantamos da poltrona, Amanda entrou aos prantos dentro de casa, tinha se machucado com um espinho da roseira. Ela disse que havia tentado retirar uma rosa. Instantes se passaram e ficou tudo bem. Mas Amanda estava um pouco entristecida, parecia frustrada por não ter conseguido a rosa. Passei minhas mãos pelos seus cabelos macios, olhei nos seus olhos celestiais e perguntei porque estava tão cabisbaixa. Ela me respondeu com uma voz trêmula e em lágrimas: “Queria tirá-la para você, vovô!” . Eu retribuí essa manifestação de carinho com um caloroso abraço e um beijo na testa.
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